pego a carteira
coloco peso no bolso
pego máscara
cubro nariz e boca
tato
toco elevador
entro
o chão muda de lugar
gravidade
vinte andares
um
por
um
percebo que meu peso muda
ao descer a relação é outra
primeiro subsolo
carro
carona do filho tenso
quer atenção?
já fiz tanta coisa que ele não gostou
coisas da face mãe
meu corpo mãe
avenida:
você não gosta do outro caminho?
penso:
ah, é que aquele retorno não existia
memória do bairro conversa comigo
o céu quer cair
gotas no para-brisa
danço palavras
boca ventando a máscara
conversa pausa
desço do carro
eu na calçada
homens saem decididos da esfiharia
freiam
eu paro
damos um novo passo ao mesmo tempo
quase trombamos
gargalhadas
sigo num passo quase salto para a peixaria
2kg de cação, moço, tem?
acho que antes falei boa tarde
a travessa
a balança
o peso
a carne de peixe
nada sabe o que estou fazendo ali
faço que não sei também
cartão na maquininha
digito
senha errada
qual é o corpo que confunde as senhas?
comento com a moça sobre o esquecimento
falamos algo sobre essa vida cheia de senhas
sorrimos uma para a outra
somos só e juntas
sacola
2kg a mais na minha gravidade
entro no carro
álcool gel
meu filho espera coisa as coisas que não tenho
quer falar com uma mulher
mãe
que não existe mais
o cheiro do peixe
frequência tensa
meu corpo responde
com saliva batendo na máscara
como quem quer dançar
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Memória de uma aula que vivi em 2020. Saí da aula e fui comprar peixe. Improvisação com Dudude Herrmann - 19/11/20