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26 Jul
83. O Jogo da Amarelinha

Idéias que surgiram no banho da manhã foram efeito da leitura que fiz antes de dormir. Passei o dia com a leitura e com as ideias. Vou abrir o assunto, provavelmente deixarei muitas pontas. Lá vai:

No final do livro O Jogo da Amarelinha, encontramos trechos de cartas que o Cortázar escreveu falando sobre o livro. Ele dizendo que não sabia se poderia chamar de romance, que escreveu capítulos de forma saltada. O uso do jogo na escrita, a aleatoriedade. Gosto quando ele fala "sou ao mesmo tempo leitor e autor do que vai saindo." (p. 541)

Em um vídeo sobre o livro, soube que o Cortázar espalhou os capítulos pelo chão da casa de um amigo, para achar a ordem (ou as ordens) do livro. 

Fiquei pensando em como reunir o que venho experimentando em um novo artigo, ensaio, memorial que contarei sobre a pesquisa que faço e registro aqui do blog. Achei importante escrever aqui as reflexões que tive no banho. Tentar falar do blog no blog. Fiquei pensando o que do escrever de forma saltada se parece com o fluxo da memória. O blog possui uma linha de tempo, mas o que posto, não. 

Imaginei elaborar, como o Cortázar, um tabuleiro que sugira a leitura, mas também que jogue com outras plataformas na internet. Ir saltando da tecnologia livro para a tecnologia Spotify, por exemplo. Sair da leitura para a narração e com isso provocar uma experiência ao leitor-receptor. Pensei que esse fluxo pode colaborar para que a experiência "pesquisa", os saltos que o processo criativo causa, seja compreendida também por sensações que venho experienciando durante o processo.

Entreguei no dia 16/7, um artigo que chamei de Corredor Tabuleiro. Utilizei alguns elementos que venho explorando. Na última semana, peguei alguns dos conceitos que me utilizei e desgastei as palavras. Um exercício, uso poético dos termos, um soltar a escrita e sentidos mais oníricos do que venho explorando. Imagens inesperadas surgem nesse jogo. 

Voltando aos trechos do livro, o Cortázar se questiona o tempo todo sobre o que está fazendo. Fala coisas que me encantam, como "O que penso é que a realidade cotidiana em que acreditamos viver é apenas a fronteira de uma fabulosa realidade reconquistável, e que o romance, como a poesia, o amor e a ação, deve se propor a adentrar essa realidade."

Os trechos são como pistas do que será. Um pouco do que se espera quando está se criando algo novo. Não se tem como saber o fim. Ele compara com um almanaque, com um jogo que se parece com a busca em uma lista telefônica.

Fiquei imaginando que as listas telefônicas são hoje um jogar um nome em um navegador de internet. Buscar na lista telefônica significa "dar um Google".  

As ideias do banho da manhã engravidaram. Imaginei também como montar meu tabuleiro, como apresentar as peças que venho usando para o jogo. A menina que foi sequestrada, a vizinha do 32, o zelador que usa a vaga da garagem do 31 e que me irrita, contrange, mas que nunca comentei, mas que garante um belo conto. Os videos, as luzes, as lajotas quase espelhos, as cortinas. As palavras e conceitos que desgastei até virarem sonho. As lembranças de cupins roendo a casa até o apartamento voar ganhando outra camada. Os momentos que levo um poema na calçada, o desejo de instalar a cadeira de balanços de frente a árvore. Abrir fendas, transitar, dentro-fora, avenida, corredor de dentro, conversando com o corredor de trólebus. 

Qual é o meu jogo da amarelinha? 

Sei o que pode ser, sei que jogo para saber. Sei que, definitivamente, Cortázar me inspira.

P.S.: Estou lendo O Jogo da Amarelinha utilizando o tabuleiro de leitura.

CORTÁZAR, Julio. O Jogo da Amarelinha. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2019. 

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