Cheguei de carro e encontrei a vizinha do 21 na garagem. Depois daquela conversa padrão de oi, tudo bem?, quanto tempo, como está sua mãe?, faz tempo que não falo com ela; me perguntou:
- Você vai morar aqui?
Eu me perguntei:
- Vou?
Respondo que não, que estou estudando no apartamento vazio.
- Vazio? - me questiono.
Sempre falo e escrevo aqui que vivi os 20 primeiros anos de vida no apartamento 31. A vizinha do 21, a Roseli, sempre viveu ali.
Eu me lembrei do seu pai, o Seu Vicente. Eu era muito pequena. Minha mãe conta que falei uma coisa constrangedora no elevador:
- Mãe, olha o trapalhão! - Achei que ele era o Zacarias. Acho que posso imaginar a cara da minha mãe. Também calculo a minha alegria e o tamanho do meu sorriso.
Fui aluna da Roseli. Estudávamos balé na mesma escola. Ela era da turma mais experiente. Ela era (e é) formada em Educação Física e certa época ela deu algumas aulas de Ginástica Rítmica ou Olímpica na escola de dança. A turma não deu muito certo, não teve muita procura, mas as poucas aulas que tive com ela eram muito alegres para meu corpo.
Era uma menina de movimentos. Rodopiava pela casa, dava saltos, virava cambalhotas e estrelas. Desafiava a gravidade? Muito pequena eu cismei de plantar bananeira. Caí de nariz, o que rendeu certa vergonha na escolinha. Tenho lembranças de uma enorme casca de ferida que eu ainda chamava de nariz.
E a vizinha do 32? O cheiro de cigarro era dela ou vinha pela escada?
Lembrei de outras fotos que a Bu me passou. A Dé, meu pai e minha mãe estavam fumando. Eu não poderia aparecer fumando, só fumava escondido.
O último comentário da Sônia, minha orientadora, ela escreveu que as janelas que continuam ali.
Sei que escrever a última postagem mexeu bastante comigo. A avenida guarda muita história. Eu me lembrei de uma música:
Na canção falo das janelas, das cortinas, das venezianas. Acho que é a música que mais me lança para o apartamento, para minha vida ali, minha adolescência e toda liberdade que aquele tempo tem me feito tocar.