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17 Sep
117. Blog como Caderno de Artista

A escrita do blog aconteceu inicialmente como necessidade. Numa segunda perspectiva, foi o entendimento de que o que eu faço aqui, faz parte da minha metodologia de pesquisa em artes. 

Me recordei agora de uma fala da professora Dra Marília Velardi em aula do Mestrado. Ela trouxe a ideia de que, no caso da pesquisa em artes, na pesquisa de quem pesquisa de dentro, é preciso criar métodos e epistemologias próprias. Para isso ela propôs uma série de questionamentos sobre como nos relacionamos com nossas pesquisas. No meu caderno de aulas eu encontrei algumas perguntas:

- Como me relaciono com o tempo? Uso o passado e penso no futuro? Só penso no futuro?

- Por que eu quero fazer isso?

- De qual maneira flui meu pensamento para achar isso interessante?

- Como eu penso? Como eu penso para fazer o que eu faço?

- Como me organizo?

- Como eu organizei meu pensamento?

No momento em que ela fez essa pergunta que destaquei em negrito, minha memória voltou para o momento em que comecei a pesquisar para meu TCC de pós-graduação. Março de 2020, início da pandemia causada pela Covid-19, meses antes de iniciar o mestrado. Comentei que a escrita de um blog partiu como necessidade. Com a falta de encontros presenciais, eu senti que precisava organizar a minha comunicação com meus colegas e com a minha orientadora, profa Dra Karina Almeida. Eu achei simples escrever diversas postagens apresentando tudo o que estava realizando em casa. A ferramenta me auxiliou. No blog é possível escrever, colocar fotos, postar vídeos, linkar referências. Mas a pergunta não questiona exatamente o uso de ferramentas, mas propõe a reflexão sobre a organização do pensamento, como que o artista-pesquisador pensa, na forma em que o pesquisador transforma suas descobertas em conhecimento. 

Na época, revisitei o blog que utilizei na Pós-Graduação e apresentei ao Núcleo de Pesquisa da Presença, coordenado pela profa Dra Sônia Machado de Azevedo, que também me orienta no mestrado. Ao reler e apresentar o blog, pude me apropriar da forma que eu estruturei meu pensamento e também a forma que o blog contava a minha trajetória, a construção de um exercício cênico e a escrita de um memorial analítico de processo. 

O blog daquele momento e este blog, Corredor de Memórias, se propõe a comunicar a pesquisa em andamento, livros e trocas que me afetam. Falo sobre as dúvidas e descobertas do e no processo. Nessa dança, conto memórias, crio textos literários, apresento vídeos, apresento músicas. O empilhamento de postagens, feito em ordem cronológica, sem uma classificação de temas, pode gerar uma ideia de desordem, de caos criativo. Mas é exatamente o que aconteceu, o termômetro da pesquisa no dia. É um caderno de artista, mas também um caderno de pesquisadora. Um registro no dia, numa falsa ideia de linearidade, mas num tempo que voa com a memória, não linear, como na própria vida.

O Corredor de Memórias mostra como eu organizei até aqui o meu pensamento. Uma pesquisa plural reunida num mesmo espaço. Nas últimas semanas reli e estou relendo o blog, classificando as postagens, coisa que só é possível fazer depois de compreender o que estava criando. Cecília Salles nos diz que as tendências poéticas vão se definindo ao longo do percurso: são princípios em estado de construção e transformação. Trata-se de um conjunto de princípios que colocam uma obra em criação específica e as produções anteriores de um artista em constante avaliação e julgamento (Salles, 2011). 

Percebo o que conto e com o que isso se articula, localizo e relaciono as recorrências na minha fala-escrita. Encontro no blog textos e vídeos sobre performance, pequenos contos e também a criação de trilha, sons do corredor. 

Num próximo texto, espero que amanhã, pretendo discutir um pouco mais. Falar sobre os cadernos de artistas e a contribuição desses cadernos para o estudo do movimento criador. Identifico que é relevante para minha pesquisa compreender a colaboração desse tipo de documento para o meu estudo.

*Livro citado: Gesto Inacabado - Cecília Almeida Salles

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